Entrevista: Procurador Rafael Miron fala sobre o papel dos cartórios no combate à corrupção

| | 26 de outubro de 2018


O Procurador da República, Dr. Rafael Miron, lançou o livro Notários e Registradores no combate à lavagem de dinheiro no último mês de agosto. Resultado de sua pesquisa para o mestrado, a obra aborda o papel dos cartórios como importantes aliados no combate à corrupção e sugere, ainda, quatro mecanismos de investigação já implementados na Espanha para que os cartórios possam atuar mais incisivamente contra crimes como lavagem de dinheiro.

Formado em Direito pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), Dr. Rafael Miron é especializado em Direito Constitucional e em Direito Notarial e Registral, ambas pela Universidade Anhanguera (Uniderp) e atua como Procurador da República do Ministério Público da União em Santa Catarina desde 2004. Ele estará nesta sexta-feira (26/10) em Caldas Novas, palestrando no 1º Congresso Notarial do Estado de Goiás sobre o tema A atividade notarial e o combate à lavagem de dinheiro.

Confira abaixo a entrevista com Dr. Rafael Miron, concedida especialmente para o Sinoreg GO.

Sinoreg GO: Como surgiu o tema para o livro?

Dr. Rafael Miron: Em outubro de 2015 eu estava acompanhando minha esposa, então Tabeliã de Notas, no Congresso da União Internacional do Notariado Latino no Rio de Janeiro. Nesse evento, o tema foi abordado em um painel muito interessante com representantes do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), Conselho Nacional da Justiça (CNJ) e Ministério da Justiça. Na mesma época eu estava iniciando meu mestrado e ainda sem definição da pesquisa que desenvolveria. Senti-me numa posição privilegiada pois ao mesmo tempo que atuo como membro do Ministério Público Federal em Curitiba com atribuições no combate à lavagem de capitais, possuo algum conhecimento da área notarial e facilidade de acesso a informações da atividade, dada minha relação familiar e de vários amigos comuns com minha esposa. Além disso, vi na questão um grande benefício coletivo, e que eu poderia contribuir para que o tema fosse efetivamente regulamentado no Brasil.

Sinoreg GO: Quais os mecanismos de investigação na Espanha que o Dr. cita no livro?

Dr. Rafael Miron: São quatro mecanismos:

a) índice único informatizado de atos notariais e de clientes;

b) catálogos de operações de risco;

c) órgão central de prevenção;

d controle de titularidade e de beneficiários finais de atividades empresariais;

Todos eles, com algumas modificações, podem ser implementados, sem muita dificuldade no Brasil. Eu gostaria de destacar aqui entre essas medidas o Órgão Central de Prevenção, que é o principal responsável pelo sucesso do sistema Espanhol. Trata-se de um órgão de análise de informações, bem como de orientação a profissão, que funciona dentro do próprio órgão de classe espanhol. É reconhecido internacionalmente pela excelência dos serviços prestados no combate à lavagem de capitais.

Sinoreg GO: O que o Dr. acha que falta para que tais mecanismos sejam aplicados no Brasil e como eles podem ser aplicados?

Dr. Rafael Miron: Falta a regulamentação pelo Conselho Nacional de Justiça das comunicações que devem ser realizadas, e da forma como essas comunicações acontecerão. Nesse aspecto, as discussões no CNJ estão estagnadas. Um ponto importante a ressaltar é a importância de que a classe acompanhe a regulamentação. Isso para que se criem mecanismos que aproveitem os sistemas já existentes (ex. CENSEC), as peculiaridades e potenciais da atividade notarial. Do contrário, corre-se o risco de se repetir padrões básicos de regulamentação que são utilizados para outros setores, com um ganho social aquém do potencial da atividade.

Sinoreg GO: Como ampliar a atuação dos notários e registradores no combate à lavagem de dinheiro?

Dr. Rafael Miron: O importante mesmo é a regulamentação do CNJ. Agrego de informação aqui que o Ministério Público Federal postulou na ENCCLA – Estratégia Nacional de Combate a Corrupção e a Lavagem de Dinheiro – a inclusão do tema como uma das metas da entidade para o próximo ano, o que possivelmente acontecerá. Como a ENCCLA é o principal fórum de debate dos órgãos estatais e setores privados envolvidos no combate à lavagem de capitais, acredito que o tema será mais amplamente debatido pelos atores comprometidos com o combate a esses crimes no próximo ano. Para finalizar, eu gostaria apenas de ressaltar que vejo nessa atividade, ou seja, na colaboração de notários no combate a lavagem de capitais um grande potencial para o enobrecimento e engrandecimento da própria atividade perante a sociedade brasileira.

 

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